A Coisinha Não Fez A Coisa!

Tenho algumas ideias para partilhar sobre desenho de interface de utilizador. Isto vem da perspectiva de alguém que está envolvido em desenho de interfaces, na qualidade de full-stack developer. O leitor pode não se considerar envolvido em desenho de interfaces, mas se o seu trabalho faz coisas que interagem com pessoas - através de uma “interface”, por assim dizer - provavelmente está envolvido. Estas ideias passam por assumir responsabilidade pelos nossos desenhos, e não quero fazer o leitor sentir-se desconfortável, nem quero trazer o meu próprio trabalho à baila, por isso consideremos um cenário fictício.

O Incidente

07:04, Sexta-feira: O utilizador Alex abre um incidente. “Liguei A Coisinha™. Esperei 3 horas e não fez A Coisa™. Confirmei que todos os trambolhos estavam na posição superior. Resolvam!”

10:03, Segunda-feira: O Apoio ao Cliente traz o incidente à equipa de Desenvolvimento. A Coisa™ nunca é executada se houve trambolhos, independentemente de estarem ao penduro ou na posição superior. Erro do utilizador, caso fechado. O Apoio ao Cliente deverá prestar instruções ao cliente sobre o funcionamento especificado do sistema e oferecer um pacote de formação no valor de 0,5% dos rendimentos anuais do cliente.

Porque É Que Afinal O Utilizador Tinha Razão

Nós é que sabemos. É isso, é só isso. Como nós é que desenhamos os sistemas, sabemos à partida mais sobre eles que os nossos utilizadores finais.

A equipa de Desenvolvimento está bem ciente de que não pode haver trambolhos em jogo para fazer A Coisa™. Como é que o sistema poderia fazer A Coisa™, se precisa de desabilitar o desacumulatrão? Se os trambolhos estiverem ao penduro, é óbvio que é impossível - até os utilizadores sabem! - mas mesmo que estejam na posição superior, puxam corrente da des-re-pré-laminadora.

Até o leitor chega a essa conclusão, certo? Espero bem que não, seria um péssimo sinal.

A questão é que nós, humanos, partimos de pressupostos e usamo-los para promover decisões mais rápidas. Também não sabemos aquilo que não sabemos, e não sabemos o que é que os outros não sabem.

Haverá um desenho melhor?

Há algumas opções:

• Um descritivo que pede ao utilizador que verifique que não há trambolhos;
• A Coisinha™ pode ser desabilitada, quando há trambohos;
• A Coisa™ pode ser precedida por um processo de remoção de trambolhos;
• O estado actual dos trambolhos pode ser mostrado próxima d’A Coisa™ - especificamente se estão ao penduro ou na posição superior, e se estão presentes de todo;
• Qualquer combinação destas opções pode ser acompanhada de um pedido de confirmação.

Qual destas é a melhor? Com sempre disse (e muito bem!) um professor muito perspicaz que me deu aulas na faculdade: “depende”.

A Lição

Os utilizadores são como nós: tomam decisões e agem de acordo com a informação e affordances que lhes são apresentadas. Têm menos informação e affordances que nós, portanto é provável que tomem decisões menos informadas e ações menos eficazes.

Teremos sempre que equilibrá-las com os requisitos reais do sistema e com outras considerações, mas se o utilizador final não é capaz de fazer aquilo que precisa de fazer, porque não lhe demos informação suficiente ou não lhe permitimos executar as ações necessárias, é culpa nossa, não dele. Portanto, sejamos positivos e não defensivos, mesmo quando o utilizador devia saber - façamos com que saiba. Pensemos no humano e vamos fazer com que tenha uma vida melhor.